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Quando a greve tomou conta do twitter, com a hashtag #FEDERALemGREVE, muitos leitores do blog me cobraram um texto. Na verdade não só a mim como aos outros membros. Achamos que era cedo demais, pois ainda precisávamos ler mais sobre a greve para nos aprofundar melhor sobre o assunto.
Houve o twittaço, a passeata, e o blog divulgava tudo através de seu perfil no twitter, mas ainda existiam pedidos de textos sobre a greve...
Demorou, mas conseguimos mais que um simples texto, conseguimos uma entrevista com o Francisco Aragão Azeredo, mais conhecido por "Chico" (ou para os twitteiros, por @chcapet), geógrafo, professor da rede IF e membro do conselho de ética da greve.
Roger Amaral: Bom, em primeiro lugar te agradeço por disponibilizar parte do seu tempo para nos dar essa entrevista, sei que ultimamente o seu tempo tem sido corrido.
Francisco Aragão Azeredo: De nada, é um prazer estar aqui dando essa entrevista.
R: Então vamos começar. O que incentivou o início da greve?
F: Bom, em relação ao Sinasefe (Sindicato Nacional dos Servidores Federais
da Educação Básica, Profissional e Tecnológica) o fato de que o governo vem enrolando nas mesas de negociação desde o começo do ano (se não me engano março). Ao mesmo tempo, o governo dizia que o prazo limite era o fim deste mês, agosto. E o Duvanier (do MPOG, Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão) ficou a maior parte do tempo dizendo que o governo não tinha como dar aumento nenhum nas bases, ou seja, nos institutos. Pesaram fatores como a bagunça que vem sendo essa expansão da Rede Tecnológica, com vários campi sendo implantados em lugares sem infra-estrutura alguma, ou mesmo campi fantasmas. Tem uns 3 campi que o site do MEC (Ministério da Educação) lista como existentes na Bahia que ainda estão no começo das obras. Além disso, há fatores como a defasagem salarial da categoria do MBTT (Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico) como um todo e que afetam principalmente os profissionais novos, que ganham salários inferiores aos pagos pela prefeitura do Rio, no caso dos graduados, por exemplo. E a célebre questão da progressão por titulação dos docentes do MBTT, que é prevista em lei mas não vem sendo cumprida adequadamente
da Educação Básica, Profissional e Tecnológica) o fato de que o governo vem enrolando nas mesas de negociação desde o começo do ano (se não me engano março). Ao mesmo tempo, o governo dizia que o prazo limite era o fim deste mês, agosto. E o Duvanier (do MPOG, Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão) ficou a maior parte do tempo dizendo que o governo não tinha como dar aumento nenhum nas bases, ou seja, nos institutos. Pesaram fatores como a bagunça que vem sendo essa expansão da Rede Tecnológica, com vários campi sendo implantados em lugares sem infra-estrutura alguma, ou mesmo campi fantasmas. Tem uns 3 campi que o site do MEC (Ministério da Educação) lista como existentes na Bahia que ainda estão no começo das obras. Além disso, há fatores como a defasagem salarial da categoria do MBTT (Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico) como um todo e que afetam principalmente os profissionais novos, que ganham salários inferiores aos pagos pela prefeitura do Rio, no caso dos graduados, por exemplo. E a célebre questão da progressão por titulação dos docentes do MBTT, que é prevista em lei mas não vem sendo cumprida adequadamente
Eu acho que isso ajuda a explicar PARTE das nossas razões. Esse link tem as tabelas salariais dos três regimes de trabalho do MBTT (aqui)
Favor considerar que a Prefeitura do Rio de Janeiro tá fazendo concurso pra pagar mais de 3,4 mil reais pra matrícula de 40 horas. Detalhe importante: sem exigir dedicação exclusiva.
R: O início da greve de seu no início de agosto, certo? Em que dia?
F: O IFRJ teve a greve deflagrada no dia 11 de agosto, em Assembléia com 151 votos a favor, 17 contra e 5 abstenções, o que foi um recorde da história da instituição, com presença da maioria dos 11 Campi e da Reitoria. A greve mesmo começou na terça seguinte, 16 de agosto e no dia 18 houve uma assembleia com um número próximo a 300 servidores que referendou o movimento. Sendo que é preciso considerar que em Campi longínquos, como Arraial do Cabo e Volta Redonda a maior parte dos servidores realizou assembleias locais com ampla participação. Lembrando que nesses campi estão boa parte dos problemas de infra-estrutura de nossa rede.
Ah, e eu esqueci de comentar: em nome da "inclusão" o governo quer acabar com o Ensino Básico em instituições como o INES (Instituto Nacional de Educação dos Surdos) e o Instituto Benjamin Constant, que ensinam respectivamente a surdos e cegos, de modo que o INES foi um dos primeiros institutos a entrar em greve no Rio
Se é que não foi o primeiro.
R: Você pode citar algumas reivindicações? Como o valor do reajuste do salário dos professores?
F: O Sinasefe reivindica um reajuste urgente de 14,67%, 10% do PIB destinado à educação e que se retomem as negociações para as mudanças das carreiras. (link para a pauta aqui) Note que a reestruturação da carreira vem sendo prometida desde o segundo governo do Lula. E a meta era equiparar o magistério federal às carreiras da Ciência e Tecnologia. Olha isso aqui e veja a disparidade dos ganhos dos professores com os de outras carreiras que demandam MENOS QUALIFICAÇÃO no Serviço Público Federal.
R: Quantos campi (incluindo ensino médio, técnico e superior) já aderiram à greve?
F: De acordo com o informe do Sinasefe, cerca de 220 campi, mas eu descobri que eles contam o Pedro II como um único campus e se você considerar cada unidade do Pedro II um campus, o número pula pra 233.
R: Como as autoridades estão vendo uma das maiores (ou a maior) paralisação da rede federal de ensino da história?
F: Ótima pergunta. O Haddad (Ministro da Educação) veio negociar diretamente com o Sinasefe, marcou uma reunião na quarta passada e foi muito solícito com a pauta de reivindicações que não diz respeito à questão salarial e de verbas. Diz ele que o MEC não tem ingerência sobre questões de orçamento, que são do encargo do MPOG. No MPOG, o encarregado de negociar salários com servidores é um tal Duvanier que foi da CUT (Central Única dos Trabalhadores), e cuja palavra de ordem é dizer que "não negocia com grevista". Isso em um governo liderado por um partido que diz ser dos trabalhadores... No momento, o MPOG abriu uma janelinha, acredito que por pressão do MEC, pra negociar com a Conlutas, central sindical à qual o Sinasefe está filiado. Na verdade, tem coisas que estão rolando em Brasília neste momento. Hoje o Sinasefe se reuniu com o MEC e a Conlutas com o MPOG, e claro, há a questão dos técnico-administrativos da Educação, que até agora não receberam proposta nenhuma do governo.
R: E a questão da expansão demasiada de campus sem infraestrutura da rede IF? Fiquei sabendo que alguns não tinham nem prédio e outros estavam com o teto caindo, é verídica a informação?
F: Sim, esse do teto que caiu se não me engano é em Alagoas, Penedo. Sobre não ter prédio, deixe-me contar a história da minha admissão...
Eu fiz concurso pro IFRJ em 2006, ainda era CEFETEQ a instituição. Minha vaga era para Paracambi, mas no meu concurso tinha uma ou duas vagas pra São Gonçalo, onde eu acabei sendo lotado. Fui convocado no final de 2008 e tomei posse em janeiro de 2009. Quando cheguei em São Gonçalo, o "campus" era composto por TRÊS SALAS numa escola municipal, o Ernani Faria. Só no final daquele ano é que a prefeitura (depois de assinar um convênio em 2006 ou antes) cedeu um CIEP caindo aos pedaços pro IFRJ. O tal CIEP só ficou minimamente habitável em meados de 2010, e ainda estamos reformando salas...
Não estou contando nenhum segredo quando digo que o Campus Mesquita ainda funciona no Campus Nilópolis do IFRJ e que até um ou dois anos atrás o Campus Realengo também funcionava em Nilópolis. E isso no Rio de Janeiro, que está longe de ter a pior situação. Em Arraial do Cabo o campus também ficou por muito tempo dentro de uma escola municipal.
R: E a mídia, o que tem falado sobre a greve? Tem tido divulgação? Os grandes portais de internet, divulgaram?
F: Muito pouca. Digo, no interior a coisa é diferente, em Volta Redonda e Arraial do Cabo apareceram nos noticiários locais da Band e Globo, que eu saiba. Arraial fez manifestação em conjunto com o IFF, que tem Campus em Cabo Frio. No Rio de Janeiro o máximo que se vê é notícia na Internet e ainda assim falam como se a greve fosse exclusiva do Pedro II. O IFRJ tem um problema grave de divulgação. E claro, eu acho que a situação dramática do INES não teve divulgação o bastante. Tipo, querem acabar com a escola especializada em surdos e jogar os alunos deficientes em instituições despreparadas para recebê-los
R: Finalizando, gostaria de deixar alguma mensagem aos estudantes?
F: Em primeiro lugar, obrigado pelo apoio. O pessoal nos Campus onde eu trabalho, Maracanã e São Gonçalo, vem sendo fantástico. Em segundo lugar, tenham um pouco de paciência com essa coisa de greve. Eu já fui estudante, sei que isso complica todo o calendário (e como professor ainda mais) mas a gente sempre se recupera. E não se esqueçam de que se ainda existe Rede Federal de Educação Tecnológica (e Colégio Pedro II, colégios de aplicação e muitos etc) foi porque no passado o pessoal se mobilizou contra os abusos perpetrados por burocratas que em geral nem sabem direito o que é uma sala de aula. A Rede Federal de Educação Tecnológica não pode ser tratada como uma peça de propaganda por um governo que quer fingir que leva a Educação a sério
R: E ao governo, alguma mensagem?
F: Deixe-me ver... Vocês foram eleitos ara dar uma educação digna ao povo, não para cortar R$3,1 bi do orçamento da educação e não para dar cada vez mais dinheiro para os banqueiros. Tratem a Rede Federal de Ensino como ela merece ser tratada, e não a joguem ao descaso.
Roger Amaral: Enfim, muito obrigado pela sua entrevista, muito mesmo, e desejo uma boa negociação para vocês grevistas e que o cenário da rede federal de ensino mude
Francisco Aragão Azeredo: Muito obrigado, a ajuda do blog pode parecer pouca, mas é importante, e qualquer apoio, por mínimo que seja, é bem vindo.
A carta aberta à população sobre a greve da Rede Federal de Ensino pode ser lida aqui